sábado, 20 de abril de 2019

Sobre a Dor e o Prazer da Profissão

Há quem diga que o mundo acadêmico está doente. Ou seria ele um mundo doentio?
Presumo, junto com a maioria, que o ambiente acadêmico deveria ser distinto dos demais ambientes de trabalho, uma vez que, por formação, estaríamos todos mais no âmbito da racionalidade do que no da sentimentalidade. Mas no que razão e sensação se distinguem se não pela totalidade e universalidade de uma e pela particularidade e singularidade da outra?
No entanto, a racionalidade acadêmica continua sendo instrumental, técnica, perdendo de vista a totalidade da vida humana como pessoal, profissional, social, econômica, artística. Ou seja, torná-la instrumental é deixar de usá-la para compreender e mudar a realidade, usando-a apenas para defender os interesses pessoais.
Isto é mais visível principalmente no serviço público. Pois tão logo se conquista a segurança de concursado, o sentimento privado se fortalece em detrimento da racionalidade pública: age-se como não se agiria numa instituição privada, na qual, ironicamente, o interesse privado é subjugado a outro interesse privado de outrem: o proprietário. 
Em instituição privada, porém, o sentimento de segurança é almejado pela relação de proximidade aos poderosos, causando submissão profissional e até pessoal. Curiosamente, a mesma mentalidade aparece também em instituição pública.
Então, criam-se discursos em defesa da instituição, pública ou privada, incoerentes com a própria ação de servidor público ou de profissional de nível superior. Aliás, "professor universitário" parece não se reconhecer como "servidor", pelo simples fato de ser um formador de profissionais de nível superior. Estranho, não?! Um poder conquistado para quê?
Eu suspeito que esta incoerência pragmática, isto é, esta discrepância entre o discurso e a prática é uma das causas de muitas doenças mentais, se já não for ela mesma uma doença, haja vista o esforço pela coerência também implicar em angústia ou depressão, se se tem que lutar sozinho, sem saber as causas e consequências dessa luta.
Esta discrepância teórico-prática parece comum a um tipo de mentalidade, isto é, a um uso mental dogmático, preso à busca ou manutenção de privilégios, em detrimento do senso de justiça; quer seja por identificar-se com a classe economicamente privilegiada, por identidade real ou imaginária; quer seja por identificar-se como indivíduo privilegiado intelectualmente, requisitando para si compensação material ou supervalorização do ego.
Não seria a falta de compreensão disso a geradora de conflitos pessoais e interpessoais? Ora, não sabermos lidar com os sentimentos advindos desse conflito parece nos colocar no cerne do problema: o conflito entre racionalidade e sentimentos. Pois daí resulta o desequilíbrio mental como adoecimento, cuja camuflagem faz adoecer o corpo.
Nessa perspectiva, não aprender a lidar com os nossos limites mentais talvez seja a causa do nosso adoecimento, o qual, por vezes, replicamos nos outros ou deles absorvemos, resultando em prazer ou dor. Mas por que alguns sentem prazer com isso, enquanto outros sentem dor?
Nietzsche diria: porque somos vontade de poder.
Mas, potência é tendência, diria Aristóteles.
E eu pergunto: se já sabemos qual a tendência, por que segui-la, se podemos mudá-la?