quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Renovando a Proposta para o Trânsito Urbano



Há tempos eu desejava lhe parabenizar pela exemplar administração pública de João Pessoa e lhe sugerir algumas mudanças no trânsito dessa cidade apaixonante. Contudo, somente após aquele nosso brevíssimo encontro na praia de Cabo Branco, em cuja conversa o nobre Prefeito agraciou-me com o seu e-mail particular, enfim, resolvo lhe apresentá-las.
Primeiramente, vale salientar o quão maravilhoso é observar como esta cidade ficou visivelmente melhor desde a sua administração!
Certamente porque, assim como os verdadeiros fieis agem de modo justo conforme a sua crença em um Deus bom e justo, ao se considerarem Sua imagem e semelhança, ou agem arrogantemente, por preferirem acreditar em um deus Todo-Poderoso, do mesmo modo esse comportamento se repete em relação aos governantes: os súditos agem bem e honestamente se acreditam que o seu governante é honesto e justo; as pessoas aprendem a pensar e a agir em prol da comunidade se assim atua o seu governo. Isto é captado pelo funcionalismo público, a partir dos dirigentes setoriais devidamente escolhidos para representar a autoridade do governante, e sintomaticamente é expressado e retransmitido para a população.
Em prol da cidadania, acredito que o melhor investimento público é sempre aquele que muda o presente fundamentando o futuro da sociedade: a Educação e a Saúde. E, felizmente, estes tem sido realizados em João Pessoa, reconhecidamente na sua administração. No entanto, há um terceiro investimento básico para a cidadania, o qual depende fundamentalmente dos dois primeiros: a segurança. Esta resulta principalmente de políticas públicas de lazer e de preservação do espaço público, através de programas culturais, mediante as artes, o esporte e a vigilância dos valores comunitários. O cidadão bem educado e saudável aprende a zelar pela boa vida, através dos programas de cidadania do poder público e da fiscalização ostensiva, que garanta a segurança e promova os bons hábitos da população.
Como diz o filósofo Aristóteles, em defesa da espécie humana naturalmente o Homem constitui família, em nome da sobrevivência as famílias se reúnem em comunidades, mas o ser humano se reúne na cidade (Pólis) em busca da boa vida, proporcionada pela boa convivência em sociedade. E, do meu ponto particular de observação, parece faltar muito pouco para a boa vida em João Pessoa, para a boa convivência social, para a tranquilidade e a segurança na via pública: o trânsito.
Eu sei que o nobre Prefeito investiu bastante no sistema de transporte coletivo em João Pessoa. Isto é louvável, pois se trata da condição necessária para o bom trânsito urbano. Porém, não é suficiente se os motoristas não forem bem educados. E mesmo a boa educação decai sem fiscalização. Infelizmente, apesar das campanhas de trânsito, ainda há muitos motoristas e principalmente motoqueiros que inibem o orgulho e o prazer em transitar nessa cidade maravilhosa. Isto, possivelmente, devido à falta de hábito que deveria ser criado através da fiscalização constante. 
Digo isso porque tenho observado os nossos agentes de trânsito e, infelizmente, eles tem falhado nesse aspecto. É comum, por exemplo, se encontrarem dois ou mais agentes em local pouco carente de sua função, em detrimento de locais próximos onde sua atenção é exigida para coibir abusos. Pior que isso é vê-los passarem por uma infração e nada fazerem, como se não a reconhecessem como tal: é carro estacionado em esquina, em cima de calçada ou da faixa de pedestre, em parada de ônibus, em fila dupla; motoqueiro ou o carona sem capacete; moto trafegando com farol apagado, com dois ou mais passageiros; ciclomotores trafegando pela pista da esquerda, a atrapalhar o trânsito, e demais veículos lentos obrigando os outros a lhes ultrapassarem pela direita; motoristas com celular ou fone de ouvido enquanto dirigem com uma única mão ao volante, buzinadas em frente a escolas ou hospitais; mudança de direção sem o uso da sinaleira devida; é veículo visivelmente irregular, sem sinaleira, sem retrovisor, sem cano de escape, poluindo o ambiente com barulho ou fumaça e nos obrigando a conviver com esse desrespeito à racionalidade e à cidadania, por falta de uma autoridade que coíba tais abusos. Pois, muitas vezes os infratores são agentes públicos, que deveriam dar bom exemplo.
Talvez a STTRANS alegue que tal fiscalização não é papel de seus agentes, mas sim do Detran. Que seja, no tocante às condições dos veículos! Mas, creio que ela tem sim um papel educativo, de advertência, para chamar a atenção do condutor objetivando que tal atitude não se repita; orientá-lo para a boa convivência no trânsito e sobre os direitos de todo cidadão, inclusive e principalmente do pedestre, vulnerável e indefeso.
Para que a fiscalização seja eficaz, é necessário que o agente de trânsito pelo menos denuncie ao Detran o condutor reincidente. Todavia, fique claro que, antes de tudo, o fiscal está sendo amigável, de modo que somente o mau condutor considerá-lo-á um inimigo. Pois, do contrário, como a STTrans cumprirá o seu "propósito de assegurar à população mobilidade, acessibilidade, segurança, fluidez e conforto nos sistemas de transporte e trânsito, respaldado na competência, satisfação profissional e nos avanços tecnológicos, contribuindo para a qualidade de vida no município"? Como ela pode ter reconhecida pela sociedade a sua Missão de "ser uma organização cidadã... trabalhando acima de tudo, para uma prestação de serviço humanizado, transparente, considerando a qualidade de vida como objetivo maior de todo esforço empreendido"?
Observe-se que o princípio fundamental do trânsito é a racionalidade. E o seu primeiro dispositivo é o estabelecimento de uma pista apropriada para cada usuário transitar em direções opostas sem se bater: no caso brasileiro, trafega-se pela direita, deixando a esquerda para o tráfego em sentido contrário. Isso serve inclusive para pedestres. Assim também a linguagem dos sinais, como o uso da sinaleira esquerda para ultrapassar outro veículo ou mudar de faixa, ou da sinaleira direita para estacionar ou autorizando ultrapassagem segura, ou para sair ou entrar na pista, assim como a alternância entre luz alta e luz baixa para pedir passagem ou avisar de perigo, além do funcionamento da luz de freio e até a buzina como alerta sonoro, tudo isso é uma questão de respeito à racionalidade no trânsito. E é o que permite a confiabilidade nos condutores. Pois, se é irracional não é confiável.
A propósito, nas campanhas de RESPEITE A FAIXA esqueceram de instruir o condutor a ligar o pisca-alerta avisando do cuidado aos outros motoristas para não o ultrapassarem naquele local, visando assim evitar o risco de atropelamento de pedestre ou de um choque na traseira do seu carro. Por isso precisamos de agentes racionais no trânsito, mais do que dos equipamentos tecnológicos irracionais. Estes devem apenas ajudar no registro e na organização do trânsito, quando os condutores já estão educados. Porém, os agentes precisam saber, de fato, usar a razão: pensar, escolher e decidir; saber identificar o bom e o mau condutores e orientar para a boa convivência no trânsito, a fim de evitar os transtornos causadores de estresse.
Considerando que o aumento do número de veículos ocorre em progressão geométrica, é fácil observar que em breve não haverá mais espaço urbano suficiente para o tráfego de veículos. Por isso, no tocante à mobilidade e acessibilidade do trânsito, eu teria algumas propostas, conforme lhe sugeri em nossa conversa na praia de Cabo Branco:
1) Transformar em MÃO ÚNICA TODA RUA PAVIMENTADA.
Isto reduziria o risco de acidentes e de estresse, uma vez que o fluxo de veículos equitativamente distribuído permitiria maior mobilidade e acessibilidade, por haver sempre uma via alternativa de acesso, mediante a rua paralela subsequente. Poder-se-ia começar pelas ruas de acesso à orla de Cabo Branco, Tambaú etc. Isso até ampliaria os estacionamentos para ambos os lados das ruas perpendiculares às principais, sem o problema de confrontamento de veículos, principalmente em locais de evento.
EXIGÊNCIA: pavimentar e asfaltar as ruas de tráfego em torno das avenidas principais até, pelo menos, o terceiro quarteirão, descentralizando as avenidas e ampliando a mobilidade e a acessibilidade, com a alternância de sentido entre as ruas pavimentadas: sempre uma vai e a outra vem; nunca ambas paralelas vizinhas no mesmo sentido, garantindo, inclusive, que os quarteirões sejam utilizados como retorno.
BENEFÍCIO: visto que o fluxo estará reduzido pela distribuição equitativa do trânsito, poder-se-á acrescentar ciclovia à margem direita do tráfego, evitando que ciclistas trafeguem pela margem esquerda da pista, e reduzindo os riscos de acidente. Além disso, quando se interditar uma via, a rua alternativa apenas aumentará o seu fluxo momentaneamente, uma vez que seu tráfego segue o mesmo sentido da interditada. Ademais, a melhor distribuição do fluxo de veículos proporcionará o empreendimento de novos estabelecimentos comerciais, gerando trabalho e renda nessas novas vias e desinflacionando o mercado imobiliário nas avenidas principais.
Obs.: a referência para tal alternância deve ser sempre as avenidas principais que, a meu ver, também devem ser de MÃO ÚNICA se não comportarem pelo menos 3 pistas em cada direção, além da FAIXA EXCLUSIVA PARA ÔNIBUS, a qual facilitará, inclusive, o tráfego de veículos de emergência, como ambulância, polícia, bombeiros etc. Estas avenidas também devem ser alternadas: por uma principal só vai, pela outra principal mais próxima só vem. Ex.: Av. Epitácio Pessoa e Av. Beira-rio, do centro à praia e vice-versa.
2) Toda avenida principal de mão única deve dispor de uma FAIXA PARA ÔNIBUS, na qual possam trafegar ciclomotores, paralelamente à CICLOVIA.
EXIGÊNCIA: usar sinalizadores horizontais luminosos em alto relevo para separar da pista a FAIXA PARA ÔNIBUS e a CICLOVIA, proporcionando maior segurança para ciclistas e ciclomotores, que trafegam geralmente à mesma velocidade dos transportes coletivos urbanos, e por conseguinte, maior mobilidade para ônibus.
BENEFÍCIOS: segurança e melhor controle do tráfego de ciclistas e ciclomotores, com menor risco de acidentes, por disporem de via exclusiva; maior fluxo e mobilidade para o tráfego de ônibus, que não precisarão mais parar fora dos abrigos de passageiros; por conseguinte, maior segurança e melhor atendimento ao usuário de transporte coletivo, motivando as pessoas a usarem mais o transporte público e a bicicleta.
Obs.: separada por sinalizadores horizontais luminosos em alto relevo, a ciclovia deve percorrer a margem direita da faixa para ônibus, passando para a sua margem esquerda nos trechos de acesso de passageiro.
3) Estabelecer ESTACIONAMENTO PÚBLICO apenas do LADO OPOSTO AO DA CICLOVIA, em todas as ruas pavimentadas. E ZONA AZUL nas avenidas principais, para garantir maior controle do acesso.
Nos trechos em que há árvores centralizadas na rua, poder-se-ia permitir estacionamento apenas entre elas, uma vez que as ruas perpendiculares, de mão única, terão estacionamento em ambos os lados.
BENEFÍCIO: a redução da quantidade de estacionamentos certamente desmotivará o uso desnecessário de carros, uma vez que o trajeto para veículo se tornará sempre mais longo e antieconômico e sem a comodidade de estacionar à porta, tornando o tráfego mais tranquilo e seguro, haja vista haver menos veículos e mais ruas alternadas para retorno ou acesso para qualquer lugar.
EXIGÊNCIA: fiscalização.
Evidentemente, tais propostas sofrerão resistência, principalmente daqueles que se apegam ao carro como o maior símbolo de status econômico e social, e cujo egoísmo pequeno-burguês lhes impede de reconhecer os direitos daqueles que nem conquistaram tal status. Entretanto, é preciso chamar a atenção para a necessidade de se implementar medidas que gerem atitudes que melhorem a qualidade de vida, apesar e a partir do trânsito. Porquanto, no ritmo em que segue a inserção de veículos nas ruas a cada ano nas capitais e grandes cidades, muito em breve não haverá mais espaço nem condição de tráfego sem o estresse cotidiano.
Vale observar que tais propostas possivelmente impliquem em maior aumento do número de motocicletas no trânsito, além de bicicletas e ciclomotores, em compensação ao decréscimo do número de carros. No entanto, é antidemocrático e racionalmente insustentável criar uma faixa exclusiva para motos. A despeito da lei, porém, nenhum trânsito comporta prolongar suas filas tão somente pelo fato de cada moto ocupar o devido lugar correspondente a um carro. Ora, somente pela irracionalidade da inveja justifica-se que alguns motoristas transitem como se fossem passar no corredor entre dois carros, impedindo assim que motociclistas o usem. Pois, se isso acontece, a consequência é o prolongamento das filas e o aumento do risco de acidentes, o que pioraria ainda mais o estresse pelos transtornos.
Todavia, é razoável que os motoristas transitem no limite esquerdo da pista da esquerda, dado o melhor ângulo de visão pela referência do meio-fio, ou que trafeguem no limite direito da pista da direita (ou do meio), guardando um corredor entre as duas pistas, pelo qual é possível o trânsito de motos, enquanto os veículos estiverem parados nos semáforos ou em marcha lenta. É apenas uma questão de bom-senso e de respeito à vida para que o trânsito flua bem e em segurança.
É preciso, portanto, desde já, criar condições de descentralização do trânsito, por meio da ampliação de trechos trafegáveis, através da pavimentação e do asfaltamento de ruas em torno às avenidas principais, visando garantir a mobilidade e a acessibilidade do tráfego por vias de mão única, proporcionando hábitos de modo democrático e seguro entre os usuários dos diversos meios de transporte rodoviário.
Bom proveito! E muito obrigado pela atenção!
fotos: http://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2012/12/
P.S.: Reconheço algumas alterações no trânsito desde que enviei esta proposta ao então prefeito de João Pessoa, Ricardo Coutinho. Visivelmente elas ocorreram em Mangabeira, Cidade Universitária e Castelo Branco. Contudo, ainda está muito aquém do que proponho. A lógica das alterações é, aliás, incompreensível, pois há placas de PARE em ruas asfaltas, paralelas à principal, que deveriam permitir o fluxo, mas dá a preferência a ruas que lhes cruzam, sem que nenhuma seja de mão única. Isso fere o bom senso de qualquer cidadão. Parece até faltar responsabilidade ou competência ou tão somente interesse público em democratizar a discussão sobre tais problemas.

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