Há tempos eu desejava lhe parabenizar pela
exemplar administração pública de João Pessoa e lhe sugerir algumas mudanças no
trânsito dessa cidade apaixonante. Contudo, somente após aquele nosso
brevíssimo encontro na praia de Cabo Branco, em cuja conversa o nobre Prefeito
agraciou-me com o seu e-mail particular, enfim, resolvo lhe apresentá-las.
Primeiramente, vale salientar o quão
maravilhoso é observar como esta cidade ficou visivelmente melhor desde a sua
administração!
Certamente porque, assim como os verdadeiros
fieis agem de modo justo conforme a sua crença em um Deus bom e justo, ao se
considerarem Sua imagem e semelhança, ou agem arrogantemente, por preferirem acreditar
em um deus Todo-Poderoso, do mesmo modo esse comportamento se repete em relação
aos governantes: os súditos agem bem e honestamente se acreditam que o seu
governante é honesto e justo; as pessoas aprendem a pensar e a agir em prol da
comunidade se assim atua o seu governo. Isto é captado pelo funcionalismo
público, a partir dos dirigentes setoriais devidamente escolhidos para
representar a autoridade do governante, e sintomaticamente é expressado e
retransmitido para a população.
Em prol da cidadania, acredito que o
melhor investimento público é sempre aquele que muda o presente fundamentando o
futuro da sociedade: a Educação e a Saúde. E, felizmente, estes tem sido
realizados em João Pessoa, reconhecidamente na sua administração. No entanto,
há um terceiro investimento básico para a cidadania, o qual depende
fundamentalmente dos dois primeiros: a segurança. Esta resulta principalmente
de políticas públicas de lazer e de preservação do espaço público, através de
programas culturais, mediante as artes, o esporte e a vigilância dos valores
comunitários. O cidadão bem educado e saudável aprende a zelar pela boa vida,
através dos programas de cidadania do poder público e da fiscalização
ostensiva, que garanta a segurança e promova os bons hábitos da população.
Como diz o filósofo Aristóteles, em defesa
da espécie humana naturalmente o Homem constitui família, em nome da
sobrevivência as famílias se reúnem em comunidades, mas o ser humano se reúne
na cidade (Pólis) em busca da boa vida, proporcionada pela boa
convivência em sociedade. E, do meu ponto particular de observação, parece
faltar muito pouco para a boa vida em João Pessoa, para a boa convivência
social, para a tranquilidade e a segurança na via pública: o trânsito.
Eu sei que o nobre Prefeito investiu
bastante no sistema de transporte coletivo em João Pessoa. Isto é louvável,
pois se trata da condição necessária para o bom trânsito urbano. Porém, não é
suficiente se os motoristas não forem bem educados. E mesmo a boa educação
decai sem fiscalização. Infelizmente, apesar das campanhas de trânsito, ainda
há muitos motoristas e principalmente motoqueiros que inibem o orgulho e o
prazer em transitar nessa cidade maravilhosa. Isto, possivelmente, devido à
falta de hábito que deveria ser criado através da fiscalização constante.
Digo isso porque tenho observado os nossos
agentes de trânsito e, infelizmente, eles tem falhado nesse aspecto. É comum,
por exemplo, se encontrarem dois ou mais agentes em local pouco carente de sua
função, em detrimento de locais próximos onde sua atenção é exigida para coibir
abusos. Pior que isso é vê-los passarem por uma infração e nada fazerem, como
se não a reconhecessem como tal: é carro estacionado em esquina, em cima de
calçada ou da faixa de pedestre, em parada de ônibus, em fila dupla; motoqueiro
ou o carona sem capacete; moto trafegando com farol apagado, com dois ou mais passageiros;
ciclomotores trafegando pela pista da esquerda, a atrapalhar o trânsito, e
demais veículos lentos obrigando os outros a lhes ultrapassarem pela direita;
motoristas com celular ou fone de ouvido enquanto dirigem com uma única mão ao
volante, buzinadas em frente a escolas ou hospitais; mudança de direção sem o
uso da sinaleira devida; é veículo visivelmente irregular, sem sinaleira, sem
retrovisor, sem cano de escape, poluindo o ambiente com barulho ou fumaça e nos
obrigando a conviver com esse desrespeito à racionalidade e à cidadania, por
falta de uma autoridade que coíba tais abusos. Pois, muitas vezes os infratores
são agentes públicos, que deveriam dar bom exemplo.
Talvez a STTRANS alegue que tal
fiscalização não é papel de seus agentes, mas sim do Detran. Que seja, no
tocante às condições dos veículos! Mas, creio que ela tem sim um papel
educativo, de advertência, para chamar a atenção do condutor objetivando que
tal atitude não se repita; orientá-lo para a boa convivência no trânsito e
sobre os direitos de todo cidadão, inclusive e principalmente do pedestre,
vulnerável e indefeso.
Para que a fiscalização seja eficaz, é
necessário que o agente de trânsito pelo menos denuncie ao Detran o condutor
reincidente. Todavia, fique claro que, antes de tudo, o fiscal está sendo
amigável, de modo que somente o mau condutor considerá-lo-á um inimigo. Pois,
do contrário, como a STTrans cumprirá o seu "propósito de assegurar à
população mobilidade, acessibilidade, segurança, fluidez e conforto
nos sistemas de transporte e trânsito, respaldado na competência, satisfação
profissional e nos avanços tecnológicos, contribuindo para a qualidade de
vida no município"? Como ela pode ter reconhecida pela sociedade a
sua Missão de "ser uma organização cidadã... trabalhando acima de tudo,
para uma prestação de serviço humanizado, transparente, considerando
a qualidade de vida como objetivo maior de todo esforço empreendido"?
Observe-se que o princípio fundamental do
trânsito é a racionalidade. E o seu primeiro dispositivo é o estabelecimento de
uma pista apropriada para cada usuário transitar em direções opostas sem se
bater: no caso brasileiro, trafega-se pela direita, deixando a esquerda para o
tráfego em sentido contrário. Isso serve inclusive para pedestres. Assim também
a linguagem dos sinais, como o uso da sinaleira esquerda para ultrapassar outro
veículo ou mudar de faixa, ou da sinaleira direita para estacionar ou
autorizando ultrapassagem segura, ou para sair ou entrar na pista, assim como a
alternância entre luz alta e luz baixa para pedir passagem ou avisar de perigo,
além do funcionamento da luz de freio e até a buzina como alerta sonoro, tudo
isso é uma questão de respeito à racionalidade no trânsito. E é o que permite a
confiabilidade nos condutores. Pois, se é irracional não é confiável.
A propósito, nas campanhas de RESPEITE A
FAIXA esqueceram de instruir o condutor a ligar o pisca-alerta avisando do
cuidado aos outros motoristas para não o ultrapassarem naquele local, visando
assim evitar o risco de atropelamento de pedestre ou de um choque na traseira
do seu carro. Por isso precisamos de agentes racionais no trânsito, mais do que
dos equipamentos tecnológicos irracionais. Estes devem apenas ajudar no
registro e na organização do trânsito, quando os condutores já estão educados.
Porém, os agentes precisam saber, de fato, usar a razão: pensar, escolher e
decidir; saber identificar o bom e o mau condutores e orientar para a boa
convivência no trânsito, a fim de evitar os transtornos causadores de estresse.
Considerando que o aumento do número de
veículos ocorre em progressão geométrica, é fácil observar que em breve não
haverá mais espaço urbano suficiente para o tráfego de veículos. Por isso, no
tocante à mobilidade e acessibilidade do trânsito, eu teria algumas
propostas, conforme lhe sugeri em nossa conversa na praia de Cabo Branco:
1) Transformar em MÃO ÚNICA TODA RUA
PAVIMENTADA.
Isto reduziria o risco de acidentes e de
estresse, uma vez que o fluxo de veículos equitativamente distribuído
permitiria maior mobilidade e acessibilidade, por haver sempre uma via
alternativa de acesso, mediante a rua paralela subsequente. Poder-se-ia começar
pelas ruas de acesso à orla de Cabo Branco, Tambaú etc. Isso até ampliaria os
estacionamentos para ambos os lados das ruas perpendiculares às principais, sem
o problema de confrontamento de veículos, principalmente em locais de evento.
EXIGÊNCIA: pavimentar e asfaltar as ruas
de tráfego em torno das avenidas principais até, pelo menos, o terceiro
quarteirão, descentralizando as avenidas e ampliando a mobilidade e a
acessibilidade, com a alternância de sentido entre as ruas pavimentadas: sempre
uma vai e a outra vem; nunca ambas paralelas vizinhas no mesmo sentido,
garantindo, inclusive, que os quarteirões sejam utilizados como retorno.
BENEFÍCIO: visto que o fluxo estará
reduzido pela distribuição equitativa do trânsito, poder-se-á acrescentar
ciclovia à margem direita do tráfego, evitando que ciclistas trafeguem pela
margem esquerda da pista, e reduzindo os riscos de acidente. Além disso, quando
se interditar uma via, a rua alternativa apenas aumentará o seu fluxo
momentaneamente, uma vez que seu tráfego segue o mesmo sentido da interditada.
Ademais, a melhor distribuição do fluxo de veículos proporcionará o empreendimento
de novos estabelecimentos comerciais, gerando trabalho e renda nessas novas
vias e desinflacionando o mercado imobiliário nas avenidas principais.
Obs.: a referência para tal alternância
deve ser sempre as avenidas principais que, a meu ver, também devem ser de MÃO
ÚNICA se não comportarem pelo menos 3 pistas em cada direção, além da FAIXA
EXCLUSIVA PARA ÔNIBUS, a qual facilitará, inclusive, o tráfego de veículos de
emergência, como ambulância, polícia, bombeiros etc. Estas avenidas também
devem ser alternadas: por uma principal só vai, pela outra principal mais
próxima só vem. Ex.: Av. Epitácio Pessoa e Av. Beira-rio, do centro à praia e vice-versa.
2) Toda avenida principal de mão única
deve dispor de uma FAIXA PARA ÔNIBUS, na qual possam trafegar ciclomotores,
paralelamente à CICLOVIA.
EXIGÊNCIA: usar sinalizadores horizontais
luminosos em alto relevo para separar da pista a FAIXA PARA ÔNIBUS e a
CICLOVIA, proporcionando maior segurança para ciclistas e ciclomotores, que
trafegam geralmente à mesma velocidade dos transportes coletivos urbanos, e por
conseguinte, maior mobilidade para ônibus.
BENEFÍCIOS: segurança e melhor controle do
tráfego de ciclistas e ciclomotores, com menor risco de acidentes, por disporem
de via exclusiva; maior fluxo e mobilidade para o tráfego de ônibus, que não
precisarão mais parar fora dos abrigos de passageiros; por conseguinte, maior
segurança e melhor atendimento ao usuário de transporte coletivo, motivando as
pessoas a usarem mais o transporte público e a bicicleta.
Obs.: separada por sinalizadores
horizontais luminosos em alto relevo, a ciclovia deve percorrer a margem
direita da faixa para ônibus, passando para a sua margem esquerda nos trechos
de acesso de passageiro.
3) Estabelecer ESTACIONAMENTO PÚBLICO apenas
do LADO OPOSTO AO DA CICLOVIA, em todas as ruas pavimentadas. E ZONA AZUL nas
avenidas principais, para garantir maior controle do acesso.
Nos trechos em que há árvores centralizadas
na rua, poder-se-ia permitir estacionamento apenas entre elas, uma vez que as ruas perpendiculares, de mão única, terão estacionamento em ambos os lados.
BENEFÍCIO: a redução da quantidade de
estacionamentos certamente desmotivará o uso desnecessário de carros, uma vez
que o trajeto para veículo se tornará sempre mais longo e antieconômico e sem a
comodidade de estacionar à porta, tornando o tráfego mais tranquilo e seguro,
haja vista haver menos veículos e mais ruas alternadas para retorno ou acesso
para qualquer lugar.
Evidentemente, tais propostas sofrerão
resistência, principalmente daqueles que se apegam ao carro como o maior
símbolo de status econômico e social, e cujo egoísmo pequeno-burguês
lhes impede de reconhecer os direitos daqueles que nem conquistaram tal status. Entretanto, é preciso chamar a
atenção para a necessidade de se implementar medidas que gerem atitudes que
melhorem a qualidade de vida, apesar e a partir do trânsito. Porquanto, no
ritmo em que segue a inserção de veículos nas ruas a cada ano nas capitais e
grandes cidades, muito em breve não haverá mais espaço nem condição de tráfego
sem o estresse cotidiano.
Vale observar que tais propostas
possivelmente impliquem em maior aumento do número de motocicletas no trânsito,
além de bicicletas e ciclomotores, em compensação ao decréscimo do número de
carros. No entanto, é antidemocrático e racionalmente insustentável criar uma
faixa exclusiva para motos. A despeito da lei, porém, nenhum trânsito comporta
prolongar suas filas tão somente pelo fato de cada moto ocupar o devido lugar
correspondente a um carro. Ora, somente pela irracionalidade da inveja
justifica-se que alguns motoristas transitem como se fossem passar no corredor
entre dois carros, impedindo assim que motociclistas o usem. Pois, se isso acontece,
a consequência é o prolongamento das filas e o aumento do risco de acidentes, o
que pioraria ainda mais o estresse pelos transtornos.
Todavia, é razoável que os motoristas
transitem no limite esquerdo da pista da esquerda, dado o melhor ângulo de visão
pela referência do meio-fio, ou que trafeguem no limite direito da pista da
direita (ou do meio), guardando um corredor entre as duas pistas, pelo qual é
possível o trânsito de motos, enquanto os veículos estiverem parados nos
semáforos ou em marcha lenta. É apenas uma questão de bom-senso e de respeito à
vida para que o trânsito flua bem e em segurança.
É preciso, portanto, desde já, criar
condições de descentralização do trânsito, por meio da ampliação de trechos
trafegáveis, através da pavimentação e do asfaltamento de ruas em torno às
avenidas principais, visando garantir a mobilidade e a acessibilidade do
tráfego por vias de mão única, proporcionando hábitos de modo democrático e
seguro entre os usuários dos diversos meios de transporte rodoviário.
Bom proveito! E muito obrigado pela
atenção!
fotos: http://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2012/12/ |
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